domingo, 3 de janeiro de 2010

I CONGRESSO DA ARBITRAGEM PORTUGUESA (1988) – 4ª E ÚLTIMA PARTE

Importa referir o cuidado que houve para que este primeiro grande evento da arbitragem portuguesa, organizado pela sua Associação de classe, tivesse sucesso, bastando para o efeito verificar o que se tratou e escreveu com a antecedência de 10 (!) meses da data da sua realização... -12.5.1988, na sede da Associação, quando se comemorou o seu IX aniversário. Da direita, Alberto Guitian, Fernando Castro, Carlos Cardoso, Joaquim Faneca e Luís Correia.-

CRONOLOGIA

ACTAS DAS REUNIÕES DA DIRECÇÃO DA APAF: -Na mesma festa. Da esquerda: Luís Correia, Mário Real, Porfírio Alves, António Ribeiro, Vieira de Carvalho e Ludgero Dias entre muitos...-

24.08.1987 – A Direcção da APAF delibera que o I Congresso seja incluído no programa das comemorações do 9º aniversário, perspectivando a sua realização nos dias 10 e 11 de Junho de 1988 (Acta 275).
07.09.1987 – Helder de Sá, Secretário da Direcção, é o responsável pela organização (Acta 276).
28.12.1987 – Foi solicitado o projecto da programação do evento, não esquecendo a logística necessária quanto ao local, deslocações, alojamentos, convites (Acta 282).
27.01.1988 – Toda a Direcção integra a Comissão Organizadora. Está assegurado o auditório do Grupo Desportivo dos Empregados do Banco Pinto & Sotto Mayor (GDEBPSM), sito na rua Duque de Palmela, em Lisboa (Acta 284).
08.02.1988 – Enviados os convites para as personalidades que integrarão Comissão de Honra: Presidente da República, Primeiro-ministro, Director e Subdirector da Direcção Geral dos Desportos (DGD), assim como o Ministro da tutela (Acta 285).
14.03.1988 – O Subdirector Geral dos Desportos aceitou o convite e diz ir estar presente. Seguiram novos convites para a Comissão de Honra: Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Presidente do GDEBPSM e à Delegação de Lisboa da Direcção-geral dos Desportos, a quem se pediu colaboração financeira (Acta 287).
13.04.1988 – A Direcção-geral dos Desportos indica o Prof. Jorge Adelino para ser o elo de ligação entre as partes. O Presidente do GDEBPSM aceita integrar a Comissão de Honra e está presente nas sessões de trabalho (Acta 289).
06.06.1988 – Presente, aprovado e distribuído o programa do Congresso. A DGD diz colaborar financeiramente, conforme o solicitado. Trabalhos recebidos, até então. Núcleo de Árbitros de Futebol do Barreiro: Formação, Delegados Técnicos e Actividades do Núcleo no contexto da arbitragem. António Ribeiro: O que é ser Árbitro. Alberto Helder: Formação e Associativismo (Acta 294).
15.06.1988 – Feita a avaliação do I Congresso a Direcção considera ter sido um êxito este acontecimento único, assim como as conclusões a que chegaram os congressistas.
Registe-se que dos 153 convites endereçados a diversas entidades e personalidades foi pouca a sua participação, incluindo dirigentes da Associação de classe, o que se lamenta. Foram considerados diversos lapsos de organização que serão objecto de relatório, a fim de serem evitados no II Congresso (Acta 295)
27.06.1988 – Foram remetidas as respectivas conclusões a todas as personalidades e entidades constante no documento final deste evento. Solicitadas audiências dos Corpos Gerentes da APA ao Presidente da República e Primeiro-ministro. A DGD atribuiu 100 mil escudos, valor já recebido, para comparticipação nas despesas (Acta 296).
18.07.1988 – Continue-se a estudar a viabilidade da realização do II Congresso englobado nas comemorações do X aniversário da Associação (1989), levando-se em linha de conta os resultados do primeiro Congresso (Acta 298).

DIVULGAÇÃO, COMENTÁRIOS E OPINIÕES

Do Jornal O Árbitro, órgão oficial da Associação, destaca-se o seguinte:
-José Alberto Mendes Neves-

Edição 50, de Fevereiro/Março de 1988, página 5
No título “Apitadelas… directas!”, JOSÉ A. NEVES (José Alberto Mendes Neves), escreve: O anúncio da intenção da APA em organizar, no corrente ano, o Congresso da Arbitragem, assume contornos extremamente importantes, pelos temas e conclusões que inevitavelmente dali sairão. Dada a importância para os Árbitros e para a Arbitragem, aqui deixamos um apelo para que todos se empenhem na sua construção, dando mostras de vitalidade e interesse.

Edição 51, de Abril/Maio de 1988, página 2
É publicado o anúncio da efectivação do I Congresso nos dias previstos, o qual é extensivo a Árbitros e Juízes de todas as modalidades (no activo ou licenciados), desde logo convidados a remeterem os trabalhos até 30 de Maio. Os temas são livres e deverão ser dactilografados ou manuscritos em letra bem legível. A Comissão Organizadora reserva-se o direito de seleccionar os trabalhos que melhor correspondam aos fins em vista. -Joã0 Manuel Vieira de Carvalho-

Na edição 52, de Junho/Julho de 1988, página 1
O Director do Jornal, o saudoso e sempre lembrado João Manuel VIEIRA DE CARVALHO, expõe o seguinte:

Parecia que seria uma “lança em África”, a realização do I Congresso de Árbitros, organizado pela Associação Portuguesa de Árbitros!
Não o foi; teve dignidade, teve conteúdo e só não teve maior número de presenças, porque as pessoas só continuam a aparecer quando lhes constam nomes sonantes, almoçaradas ou piscinas…
Mesmo assim e numa organização dentro das próprias posses da APA, com a colaboração da Casa do Pessoal do Banco Pinto & Sotto Mayor, quem lá esteve, deu o tempo por bem empregado e, decerto, a sua contribuição e a sua atenção enriqueceram-no.
-José Manuel Rosa Oliveira Henriques de Oliveira-

Ainda na edição 52, de Julho/Julho de 1988, páginas 1 e 2
HENRIQUES DE OLIVEIRA, Vogal da Direcção, exprime a sua convicção quanto ao I Congresso dos Árbitros Portugueses, afirmando ter ultrapassado a expectativa, com o texto que a seguir se transcreve:

Dignificação da classe: presente!
Espírito de classe: ausente!

Para a história fica uma realização marcante da viragem da maneira de ser e estar de uma classe desprotegida mas firme e digna.

Sem pretender concorrer com a realização federativa, e até porque, ainda que na sua maioria os trabalhos se reportassem ao futebol o Congresso visava a arbitragem de um modo geral, a acção patrocinada pela Associação Portuguesa de Árbitros terá ultrapassado as expectativas mais optimistas. Sem o staff ou o marketing e meios de grandes entidades, a APA deu prova cabal da sua capacidade de desenvolvimento de projectos e do seu empenhamento na sua prossecução. Em instalações gentilmente cedidas pelo Grupo Desportivo dos Funcionários do Banco Pinto & Sotto Mayor superiormente dirigido pelo nosso colega e sr. Mendes Dias, o Congresso terá apenas pecado pela representatividade de ausências de Árbitros. O que se não estranhou porquanto mesmo outras organizações de superiores meios igualmente se quedaria por escassa participação. Mas de facto, nos dias 10 e 11 de Junho palmilhar-se-iam terreno, apontar-se-iam caminhos, ousar-se-iam apresentar sugestões. Curioso será de registar o estilo muito próprio adoptado, de desmistificação de autêntico meeting onde todos se tratavam por tu, ou seja, onde não existiam pessoas deslocadas. A participação de ilustres convidados seria de molde a sublinhar a necessidade de autenticar, de exarar a necessidade do rápido reconhecimento no último sector que o falta fazer, a FPF (Federação Portuguesa de Futebol). Curiosamente estas palavras, estes incentivos, estes pedidos insistentes partiram precisamente dos mais altos responsáveis por Conselhos de Arbitragem de outras modalidades e mesmo do representante da Direcção-geral dos Desportos. No âmbito dos trabalhos nada ficou por esmiuçar, cuidando-se de reanalisar e equacionar toda a estruturada da arbitragem dos primeiros passos até às cúpulas organizativas e administrativas. A Formação dos Árbitros e o seu recrutamento, as escolas de candidatos e o seu acompanhamento mereceram trabalhos extraordinários pela sua pertinência de análise e pela sua autoridade técnica. A Actividade dos Núcleos de Árbitros, o âmbito dos Delegados Técnicos, as questões jurídicas interligadas ao sector foram trabalhos que igualmente mereceram este Congresso. A violência, a Sociedade e a Arbitragem Desportiva culminariam naquilo que, inequivocamente terá sido um marcante passo na viragem que a arbitragem portuguesa se propõe realizar. Não se poderá deixar de sublinhar que, como é importante que suceda sempre, não foram aprovadas conclusões de ânimo leve. Qualquer dos trabalhos mereceu larga participação e discussão por parte dos congressistas que dariam assim um contributo para aquilo que deveria ser uma base de trabalho.
Uma profunda análise das conclusões finais deste Congresso dará de imediato a imagem do empenhamento que a APA e os Árbitros portugueses têm na dignificação da sua classe. Curiosamente o primeiro ponto reforça os Conselhos de Arbitragem ao propor uma dotação adequada ao desenvolvimento dos projectos no âmbito da Formação. Igualmente é de Formação que se fala nos pontos imediatamente seguintes, desde o apoio centrado dos Delegados Técnicos (Observadores) nos aspectos pedagógicos no sentido do aperfeiçoamento constante e no necessário acompanhamento permanente dos jovens Árbitros, até aos horizontes do recrutamento a merecerem efectivo e interessado envolvimento dos media, passando pelas sugestões nas áreas de aprovação/testes, nas contrapartidas a dar aos formandos de equipamento, apetrechos, etc. e no trabalho a desenvolver de suporte e apoio mais cuidado aos Árbitros estagiários.


Coincidência de posições. Congresso dos Árbitros portugueses conclui pela indispensabilidade da presença na Assembleia-geral da FPF da APA.

Ponto fulcral porquanto de forma inexplicável o parceiro desportivo que é já reconhecido e atribuído à APA, seria o seguinte. Concluir-se-ia pela necessidade de alterar as composições das Assembleias-gerais da FPF e Associações no sentido de se dar voz (e assento) a todos os parceiros desportivos directamente parte envolvidas no futebol, Árbitros, por intermédio da sua Associação de classe, jogadores, através do seu Sindicato, Treinadores, através do seu Sindicato, e Clubes com as duas Associações, as CCFP (Confederação de Clubes com Futebol Profissional) e a ANC (Associação Nacional de Clubes). Este ponto é de importância extrema provado através do facto de quer no Congresso do Futebol em Tróia e organizado pela FPF, quer no Congresso dos Árbitros portugueses, quer nas diversas reuniões nacionais de Jogadores e Treinadores, esta proposta foi largamente difundida e mesmo aprovada. A situação não é virgem, o Inverno é verdadeiro. Quase todos os países europeus têm Federações onde os intervenientes têm lugar na Assembleias-gerais. Portugal europeu neste campo tem apenas o dr. Silva Resende na UEFA. Esta insistência da Federação em persistir na inacessibilidade aos seus parceiros desportivos que até poderiam viabilizar consensos, leva-nos a pensar que os intervenientes seriam incómodos. E quem assim pensa não pode ser criador de consensos.


Conclusões apontam objectivos: Dignificação, condições para o exercício da actividade.

Questões como a participação da arbitragem nas vistorias aos campos, o papel da Comunicação Social no cercear da violência no desporto e a ela associado, a questão de a arbitragem ser dirigida e controlada directamente por gente da arbitragem, e o debate sério sobre o futebol aberto a todos foram algumas das outras conclusões. A terminar este conjunto definidor de um posicionamento redimensionado diferente, referimos às conclusões inerentes ao futuro da APA. Sensibilizar os Árbitros para a sua responsabilidade na divulgação, expansão e consolidação da sua Associação, promover uma verdadeira descentralização, legitimando as Comissões Distritais da APA, a reformulação dos Estatutos no sentido da actualização e da operacionalidade e, finalmente, o fortalecimento dos Núcleos de Árbitros.
De modo genérico poderemos inferir deste Congresso que se definiu o objectivo da acção ao mesmo tempo que se provaria que estando representados nos órgãos federativos, seria importante o contributo a fornecer ao trabalho que é, afinal em prol do desporto, do país, da comunidade.

Também na edição 52, de Julho/Julho de 1988, página 7
JOSÉ A. NEVES, na mesma sua rubrica, expressa a análise ao que se passou naquele fim-de-semana:

CONGRESSO I – Conforme amplamente divulgado, decorreu em Tróia, o denominado CONGRESSO DO FUTEBOL, que contou com a presença dos diversos agentes desportivos, à excepção dos Árbitros, uma vez que a sua Associação de classe, não foi tida nem achada para tal evento.

CONGRESSO II – Não nos move qualquer ressentimento pela presença de alguns Árbitros no activo e de outros já afastados, sabendo até que da parte de alguns partiram algumas peças de interesse, já não aceitamos que representem a arbitragem nacional, quando ninguém os mandatou para tal. Mais uma vez prestaram um mau serviço à arbitragem, alinhando pela equipa dos senhores feudais.

CONGRESSO III – Das opiniões que através da comunicação social nos foram chegando, é legitimo retirar a conclusão que o CONGRESSO não cumpriu os objectivos para que foi organizado.
É dado adquirido que enquanto houver pessoas que defendem interesses pessoais e regionais, em detrimento do essencial, que é o futebol nacional, não vamos a lado nenhum.
Em resumo, ficaram algumas intervenções válidas (poucas) e foi evidente o antagonismo, sempre latente entre os blocos – Associações e Clubes – dum lado e os restantes do outro. Do mal, o menos, foram aproveitadas as condições climatéricas e de veraneio que o local oferece.

CONGRESSO IV – Se o Congresso de Tróia não trouxe grandes novidades, O I CONGRESSO DOS ÁRBITROS PORTUGUESES deu o seu contributo para a melhoria das condições da arbitragem nacional, dissecando e propondo acções tendentes a uma melhor racionalização dos meios e operacionalidade de todos os intervenientes nos vários escalões.

CONGRESSO V – Aqui fica o nosso lamento e alerta para que futuras organizações sejam montadas atempadamente, de modo a que tenha uma participação mais homogénea e interessada.
A semente foi lançada e pensamos que os frutos que advirão serão preciosos no futuro. Aos Árbitros, dizemos que é necessária a sua participação, já que o comodismo e a submissão de muitos, é aproveitada por aqueles que jogam deliberadamente na divisão, como factor primordial para impor o seu poderio ilusório.
Só é preciso que os Árbitros “deixem de hibernar” e soltem em uníssono o “grito do Ipiranga” e de certeza que muitas estruturas ruirão como um baralho de cartas.

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