GUARNIÇÃO: 9 TRIPULANTES
OFICIAL E COMANDANTE: 1
Manuel José Marques da Silva, 2º Tenente
SARGENTOS: 2
Agostinho Romão dos Santos, 1º Sargento de Manobra.
António da Rocha Afonso Tição, 2º Sargento Artífice, Condutor de Máquinas.
Domingos Cabaço Gardete, Marinheiro Eletricista.
Hermano Rodrigues Filipe, Marinheiro Fogueiro/Motorista.
João Caldas de Freitas, Marinheiro Artilheiro.
José Joaquim de Carvalho, Marinheiro Fogueiro.
José dos Santos Reis, 1º Grumete Artilheiro.
Manuel das Neves, Marinheiro Radiotelegrafista.
No dia 18 de dezembro
de 1961, durante as hostilidades e aquando da invasão, a embarcação foi
afundada pelo seu comandante.
Ao Comandante Marques
da Silva, é-lhe aplicada, em 1963, depois de analisado o relatório que aborda a
decisão do afundamento da Lancha, a pena de Demissão da Armada Portuguesa.
Este castigo foi
anulado em 19 de dezembro de 1974, através do Decreto-Lei 727, oriundo do
Conselho de Chefes dos Estados-Maiores das Forças Armadas, publicado no Diário
do Governo 295, I série, da mesma data, páginas 1587 e 1588, dando origem à
reintegração do 2º Tenente Manuel José Marques da Silva, nas fileiras da Armada
portuguesa.
Em 2015 o Comandante
Marques da Silva escreveu e publicou o livro “A última história de Goa-NRP Sirius”.
Entretanto, registe-se
o seu depoimento prestado ao jornal Expresso, em 19 de dezembro de 2015, que aqui se reproduz, com a devida vénia:
Cheguei a 3 de dezembro de 1961, com uma guia de marcha para ir comandar a lancha “Vega”, que, entretanto, já tinha sido enviada para Diu, com o Oliveira e Carmo. O Comandante Brito e Abreu estava em Damão com a “Antares” e sobrava a “Sirius” que tinha ficado em reparação em Goa, que não chegou a fazer. Veio para o mar no dia 13 de dezembro. Fundeei ao largo do porto de Mormugão, onde já estavam 5 navios indianos. Na madrugada de 18 de dezembro fui apanhado de surpresa com os ataques dos aviões inimigos na outra margem, onde se situava o aeroporto e os ataques dos navios da artilharia indiana. O aviso “Afonso de Albuquerque” fundeado no rio arrancou e ripostou com fogo. Entretanto, chegou uma mensagem: “Em caso de situação perdida, afundar o navio”. Quando o “Afonso de Albuquerque” foi atingido fecharam o porto e as comunicações pararam. Mantive a calma. Era a primeira vez que me acontecia uma situação daquelas. Percebi que, com o “Afonso de Albuquerque” encalhado e a ser flagelado pelo inimigo não teria hipóteses de reagir. Decidi afundar a lancha. Mandei os meus homens sair. Vieram a nadar para terra. Afundar um navio não é uma coisa fácil. Tentei abrir as válvulas de fundo para que a água entrasse. Estavam calcinadas. Lembrei-me que a lancha tinha estado no estaleiro para reparar uns veios nas hélices, porque entrava água… Talvez se fizer marcha-a-ré com toda a força contra os rochedos a água entre, pensei. Investi.
Ouvi um estrondo brutal. Quando a água começou a entrar saltei e nadei para terra. Ficamos abrigados nos rochedos e ver o fogo de artilharia e um estilhaço de um dos projeteis atingiu um Sargento que estava a meu lado e cortou-lhe a cabeça. Podia ter sido eu. Quando escureceu começamos a andar na mata. Encontramos um acampamento do Exército e soube que aquela gente ia para um campo de prisioneiros. Tinha aprendido na ética militar que devemos evitar ser feitos prisioneiros. Foi essa a segunda decisão que tomei. Fiquei sozinho com os meus homens e comuniquei que iria pedir abrigo a um carregueiro estrangeiro. Eles acompanharam-me. Navegamos de noite até ao navio grego “Olga Minakoulis”, que se encontrava mais perto e o seu Comandante deu-nos abrigo. A 25 de dezembro navegamos até Karachi onde me apresentei ao embaixador português. Já lá estava o 2º Tenente Fausto Morais Brito e Abreu, comandante da “Antares”, que tinha ido de Damão e não se tinha deixado fazer prisioneiro.
Em Portugal consideravam-nos mortos e a minha família tinha visto na RTP a minha cara a passar como herói na Índia. Enviei um telegrama ao Chefe do Estado Maior da Armada, outro à minha família. Chegamos de avião a Portugal, começou logo a correr mal. Uma carrinha da PIDE-Polícia Internacional e de Defesa do Estado (polícia política), aguardava-nos no aeroporto para nos levar ao Ministério da Marinha. Nem tive tempo de me fardar. “Então o que é que se passou no passado dia 19, em Goa?” Corrigi: “Dia 18, senhor Almirante!” Ele reafirmou: “A invasão foi a 19, toda a gente sabe…” “Desculpe, mas quem lá estava era eu…” Era péssima maneira de começar um diálogo com o Chefe do Estado Maior da Armada. Passei ao gabinete do Ministro da Marinha que imediatamente viu que eu estava muito cansado. Era 31 de dezembro de 1961. Mandou-me ir ter com a minha família.
Em maio de 1962 fui chamado para fazer declarações no âmbito do processo de averiguações. Fizeram-me três acusações. Qual o critério da minha decisão. Que teria afundado a lancha antes de tempo. Tinha-me recusado a ir para o campo de prisioneiros. Expliquei o que se tinha passado, assumi que tinha sido o único responsável pelas decisões e o processo parecia acabado, até ao dia 23 de março de 1963.
Estava de serviço em Vila Franca de Xira e a minha mulher telefona-me, dizendo que lera num jornal que eu tinha sido demitido. Como militar fui duramente punido. Obviamente, as penalizações dos militares de Goa eram um aviso para os militares de África (decorria a Guerra Colonial). Depois do 25 de abril de 1974 voltei a ser integrado na Marinha, mas como já tinha a minha vida feita como engenheiro, passei à reserva. Durante todos estes anos a minha mulher viveu sob o signo do drama Goa. Prometi que a levaria lá quando me sentisse emocionalmente preparado. Só passados 50 anos consegui voltar.